O compositor escocês James MacMillan, nascido em 1959, conta-se
entre os mais reputados da sua geração. Ele apresenta-se no terreno da nova
música contemporânea, com um idioma eclético, tendência que se afirmou em
geografias muito distintas, numa geração anterior: entre outros, Sofia Gubaidulina, Alfred Schnittke, Per Nørgård. Em MacMillann, encontramos o resultado inesperado de vários
encontros: a herança musical escocesa, o lirismo celta, a modalidade do canto litúrgico
romano, o colorido da politonalidade e a especulação atonal, os mais simples
procedimentos canónicos e a inventividade polirrítmica. É, portanto, uma
linguagem composicional que junta «mundos». Na sua música orquestral, os sopros e a percussão emergem com uma energia visceral. Mas a sua música vocal e coral
prima pela transparência lírica. Em qualquer dos registos, os procedimentos por
contraste estão entre os catalisadores mais importantes do seu processo criativo
No areópago dos compositores europeus vivos, James MacMillan
é conhecido pela expressão pública da sua fé católica. O seu ato composicional
transcreve uma espiritualidade enraizada na tradição cristã. No entanto,
MacMillan não precisa, para isso, de recuar até às linguagens musicais
europeias pré-modernas – como o faz, em alguma da sua música, Arvo Pärt -, ou
encerrar o vocabulário musical em formas litúrgicas – como acontece frequentemente com John
Tavener. A estética, nestes compositores, parece estar mais próxima de uma
espiritualidade da «fuga do mundo». MacMillan escolhe o «mundo». Situa-se, de
forma mais decidida, no tempo das tensões, dos fragmentos e das incertezas,
próprio das múltiplas modernidades. A sua fé católica aproxima-se mesmo de
algumas tendências de militância que valorizam as dimensões políticas da
identidade crente. A sua obra «Cantos Sagrados», para coro e órgão, pode ser
vista como uma transcrição poética e musical da teologia da libertação latino-americana – textos
poéticos sobre a repressão política na América Latina encontram-se com textos religiosos tradicionais. Recentemente, para a visita realizada em 2011 ao Reino
Unido pelo papa Bento XVI, escreveu uma missa (Mass of Blessed John Henry Newman) que tem a particularidade de
incluir partes adequadas à participação da assembleia litúrgica – a modernidade
própria da sua música não foi bem acolhida em alguns sectores romanos.
A obra que escolhemos para este mês, «A Child’s Prayer», para
coro misto a cappella e dois sopranos soli, pode documentar algumas das
anotações anteriores. Foi escrita em homenagem às crianças vítimas do massacre
que aconteceu na escola primária de Dunblane – no dia 13 de Março de 1996, um
homem de 43 anos, armado, entrou na escola e dizimou as crianças, antes de se
suicidar. James MacMillan escolheu uma oração tradicional infantil, da piedade
católica, para perpetuar a memória daquelas crianças. A obra foi estreada a 4
de Junho de 1996 na abadia de Westminster, pelo coro residente. A dor que se descobre
nestas breves páginas de música não se resolve, mas ilumina-se de esperança.
Alfredo Teixeira